te escrevi hoje no fim da manhã, deitada num banco que amo, perto do chão, onde quando a gente deita se sente cedendo à terra de todo o cheiro do sol entre as frestas, molhado, dos bichos pequenos que seguem correndo pelos tecidos mesmo depois no contínuo do dia, na volta pra sala, ali onde ficam os papéis, os móveis e as pessoas
quando eu te escrevi não tinha papel, nem lápis, teclado,
e, estando sozinha, tinha só eu
agora que eu te conto, tudo se imagina de novo, você pode imaginar
que tinha você perto
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no resto do dia eu fui entender
essa fenda que se abre e como é infinita pra dentro
ou então, melhor dizer, eu só comecei
muito lenta, a entender
como um encontro abre essa fenda, pra gente falar sem língua, coisa nenhuma, do oco para o oco
porque ao mesmo tempo é tanta explosão, pólvora, tão bom violento mas tão violento,
que a gente já começa a seguir pelos dias, como só pode, no viver de sobrevida,
com as palavras, camadas, o português, a madeira feita em móvel
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ainda fica, de todo jeito,constelação de ossos quebrados
mesmo com um pouco de amortecimento pra tocar,
a sensação de estar vivendo com muita força,
e um beijo muito,
até que o tempo for propício,